segunda-feira, outubro 12, 2009

A Cura dos Feridos



“Cura-me, Senhor, e serei curado; salva-me, e serei salvo, pois tu és aquele a quem eu louvo”.

Jeremias 17.14.


O mundo é um campo de mutilados emocionais. Somos uma raça estafada, extenuada e exaurida. Todos nós sofremos algum aleijão psíquico-emocional. Paralíticos afetivos se arrastam no meio dos deficientes de afabilidade. Todos nós somos carentes. Sentimos necessidades básicas em nossas afeições. Sofremos com os traumas de rejeição e não raro fazemos outros, vítimas de nosso mau-humor. Abusados freqüentemente vingam-se daqueles que o feriram, castigando outros que nada têm com o caso. Um ciclo de desforra se instala no processo de autocomiseração..

O ser humano é uma criatura enferma. O diagnóstico bíblico é realista: “A cabeça toda está ferida, todo o coração está sofrendo. Da sola do pé ao alto da cabeça não há nada são; somente machucados, vergões e ferimentos abertos...”. (Isaías 1.5b-6). Isto não é exagero. Pode ser que haja uma metonímia aqui, mas não uma hipérbole. A linguagem é alegórica, mas não abusiva.

Alguém já afirmou: “de todas as doenças, a pior doença é daquele que nega sua própria doença”. A cura é um assunto para doentes. Só os enfermos podem recorrer ao tratamento. Jesus disse: Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Eu não vim chamar justos, mas pecadores ao arrependimento” (Lucas 5.31-32). Só os doentes podem ser sarados. Só os pecadores podem ser salvos. Tal e qual somente o doente pode ser curado, ninguém poderá ser salvo se não tiver consciência de que se é pecador. Do ponto de vista espiritual, a única coisa que posso oferecer para minha cura é a consciência da minha enfermidade. A única coisa que posso oferecer para a minha salvação é o reconhecimento da calamidade e tragicidade da minha condição de pecador.

Quando o profeta clamou: “Cura-me e serei curado, salva-me e serei salvo”, estava admitindo a gravidade de sua doença e a necessidade de sua salvação. Ele se apresenta com uma confissão que se encaixa nos moldes da terapia. Aceitar sua condição de enfermo é o primeiro passo para ficar sadio. Fingir que somos fortes é um sintoma terrível de grave desordem. A sociopatia é muito difícil de diagnosticar, pois o doente camufla os sintomas com um jogo de dissimulações. A soberba é o indício claro da autopatia. A teomania foi o primeiro impulso do pecado. Um ego inflamado é insuportável para se conviver. Por isso, o tratamento começa com o reconhecimento de nossa indisposição. Ao chegar diante de Deus, com a predisposição de confessar que estamos gravemente machucados e seriamente feridos, temos a garantia de sermos atendidos.

A misericórdia é um assunto para os miseráveis. Somente quando reconhecemos o nosso estado de indignidade é que soamos o grito de socorro. Quando estamos sufocados com a dor da alma, bradamos por salvação. “Tem compaixão de mim – miserável pecador!” O falido não teme revelar o seu estado arruinado, quando se encontra diante de quem o acolhe sem reservas. O hospital é a praça dos adoentados. O pronto socorro é posto dos acidentados. A igreja é a clínica dos feridos. Não há melhor lugar para tratar dos estropiados emocionais do que na verdadeira igreja de Jesus Cristo, pois todos os componentes desta comunidade são doentes em recuperação. Ninguém deve se considerar melhor do que outro. A paráfrase de (Mateus 7.3) pode ser bem clara para o nosso entendimento: “Por que você observa o cisco que está no olho do seu irmão, mas não percebe a trave que está fechando o seu?” Thomas Brooks dizia: “Quanto mais piedoso for o homem, mais misericordioso será”. A igreja não é nada mais do que Cristo manifestando a sua misericórdia aos feridos.

Todos nós podemos nos achegar a Cristo para sermos curados. Ninguém ficará excluído se aproximar-se com a disposição de revelar-se ao único Terapeuta capaz de se compadecer de sua situação. É preciso manifestar os sintomas que nos angustiam. Confidenciar nossos segredos. Admitir nossa amargura. Confessar nossa incredulidade. Ele sabe todas as coisas, mas o seu método clínico requer que nos abramos com ele de forma sinceridade e sem reservas. “Cura-me, Senhor, e serei curado; salva-me, e serei salvo”, e a linguagem decorrente desta operação será a saudável expressão de louvor. Uma das características de uma pessoa salva e curada são os lábios que exultam em louvor e adoração. O discurso de uma pessoa sarada é também um remédio para os outros doentes. “Há palavras que ferem como espada, mas a língua dos sábios traz a cura” (Provérbios 12.18). Se estivermos sendo curados, devemos nos envolver com a cura dos outros feridos. Esta é uma estratégia graciosa do evangelho, que só a graça nos pode capacitar. Como enfermeiros do ministério da graça, oferecemos esta receita: É ele quem perdoa todos os seus pecados e cura todas as suas doenças (Salmo 103.3).

Rev. Ézio Martins de Lima

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