Entrevista com o bispo anglicano N.T. Wright sobre sermões e pregação.
Há alguns meses o autor e pastor Winn Collier contatou a www.preachingtoday.com informando-a de que tinha uma entrevista agendada com o autor, intelectual e pastor N. T. Wright e perguntou se tínhamos interesse em publicá-la. “Sim!”, eu respondi. “E não se esqueça de perguntar a ele sobre os sermões.” Foi o que Collier fez. Por meio dessa entrevista Wright nos forneceu uma breve, porém interessante perspectiva sobre seu processo de preparação de sermões.
Winn Collier: Como a sua visão teológica influencia a sua maneira de pregar?
N. T. Wright: Não sou o tipo de pregador altamente reflexivo a respeito daquilo que geralmente escrevo para os meus sermões. Não penso no que estou fazendo de uma forma estruturada – simplesmente acontece. Tenho feito dessa maneira há muito tempo: faço minhas orações, estudo as passagens sobre as quais vou pregar e, então, é como se as idéias fossem brotando de dentro para fora, e, conforme estou orando, compreendo ou pelo menos tento discernir sobre o que supostamente irei falar. Existem diferentes tipos de sermões, e quando chega a hora simplesmente acontece. Mas realmente acredito que desde que comecei a refletir a respeito da ressurreição e da justiça, vejo que as minhas pregações através dos últimos anos têm sido direcionadas especificamente para temas sociais como a perseguição de cristãos em certos países, a infelicidade das pessoas e o aquecimento global. Todos estes temas fazem parte da criação perfeita de Deus que está em sofrimento, e é a eles que a mensagem de ressurreição precisa chegar. Por isso, às vezes me pego saindo direto de João 20 para algum assunto do momento. Isso não tem muito a ver com o tipo de pregação, é apenas o conteúdo.
Você tem um estilo particular de pregação? Realmente não sei. Provavelmente sim; creio que meus amigos podem esclarecer isso melhor. Talvez eu tente dizer muita coisa para um sermão comum. Tento ser expositivo, mas não do tipo que diz que “o verso um diz isso” ou o “verso dois diz aquilo” – mas mergulho fundo na passagem e volto por um ângulo oblíquo de maneira que possa levar as pessoas a pensar certas coisas e a imaginar algumas cenas. Assim, quando elas percebem já estão no meio da passagem, e conseguem entender sobre o que estou falando. Isso é o que espero de um método: que ele sirva para levar pessoas até o ponto em que possam despertar e se surpreenderem por estar bem no meio de João 20 ou de outro trecho qualquer da Bíblia. é dessa maneira que encaro um sermão, e isso é sempre muito estimulante.
Você diz que “para viver no mundo que Deus criou é necessário usar a imaginação”. Certamente a ressurreição e o avivamento de todas as coisas ampliam a imaginação humana. Como você incentiva a imaginação em suas pregações?
Bom, talvez eu não incentive tanto quanto deveria. Porém, tento fazê-lo através de ilustrações e alusões à arte e à música, a fim de ampliar os horizontes das pessoas para que consigam enxergar outros mundos maiores que não sejam nem, a) o mundo secular em que vivem todos os dias sem se aperceberem, e nem b) o mundo das puras idéias da teologia cristã. Em outras palavras, tento encorajá-las a imaginar trechos de músicas ou de qualquer outra coisa que descortine a visão de novos mundos que estão bem à sua frente. Também costumo usar histórias ilustrativas. Faço isso em minhas pequenas séries sobre o Novo Testamento, em que cada passagem começa com uma historinha. é extraordinário como isso ajuda as pessoas a entenderem melhor. Geralmente são histórias simples, coisas do dia-a-dia; mas as pessoas dizem que “elas realmente me ajudaram a ‘entrar’ na passagem e viver em um mundo imaginário”. Um grande artista, naturalmente, faz esse tipo de coisa. C.S. Lewis faz isso em O grande abismo, onde ele pinta um quadro de um mundo mais real, mais físico e mais sólido do que aquele em que vivemos. O mais interessante é que ele torna esse mundo crível. Este é um feito extraordinário, pois não são muitas as pessoas que tentaram fazer isto, e ainda menor é o número daquelas que conseguiram. Uma mensagem deve trazer para a congregação a mesma sensação que você tem depois de ouvir uma sinfonia ou caminhar por uma galeria de arte.
Você desafia a igreja a pensar profunda e ricamente sobre arte, dizendo que “Talvez a arte possa (...) vislumbrar futuras possibilidades geradas no tempo presente”. Você acredita que – assim como escrever, pintar ou tocar um instrumento – pregar possa ser uma forma de arte?
Pregar é uma forma de arte desde que permitam que seja. Muitos pregadores, tanto de igrejas conservadoras quanto de igrejas modernas, ficam presos a uma forma particular de pregar que talvez não seja arte, sendo simplesmente mais da mesma coisa.
Em sua melhor forma, uma mensagem deve trazer para a congregação a mesma sensação que se tem depois de ouvir uma sinfonia ou de caminhar por uma galeria de arte. Ouvi um sermão maravilhoso de meu colega, o Deão de Durham, na Manhã de Oração do Domingo de Páscoa. Ele trouxe um poema e falou de sua recente viagem ao Egito; e fez com estes dois elementos um mosaico, a partir do qual chegou até a história da Páscoa. Foi extraordinário. Estávamos vendo a história sob um novo ponto de vista. Ainda tenho o sermão em minha mente. Um sermão que faz isso pelas pessoas é uma verdadeira dádiva; como uma peça de música ou um poema.
Em outra oportunidade, você mencionou que “é preciso que falemos sobre Deus. O que significa dizer que temos que fitar o sol”. Então alguém poderia pensar que para pregar, obrigatoriamente, temos que falar sobre Deus. Como fazer com que nossas mensagens conduzam as pessoas na ousada e ofuscante prática de encarar o sol?
Felizmente, quando digo que encaramos o sol é porque estamos falando sobre Jesus. Nós, pregadores, nunca falaremos o suficiente a respeito de Cristo. Precisamos lembrar a nós mesmos de que quando falamos sobre Jesus também estamos falando sobre Deus. O Novo Testamento diz que por nossa própria conta não podemos saber exatamente quem é Deus. Podemos ter varias idéias a respeito dele, mas ele é revelado através de Jesus. Precisamos educar as pessoas para pensarem novamente no significado da palavra Deus, compreendendo-a a partir de Jesus. Isso é muito difícil por que geralmente as pessoas têm em suas mentes e em seus corações conceitos sobre Deus vindos de várias fontes. Mas essas noções de Deus dificilmente estão relacionadas a Jesus. O perigo reside em que as pessoas tentem relacionar Jesus àquelas imagens de Deus que já possuem, em vez de relacioná-lo da maneira correta. é por isso que sempre precisamos nos voltar em direção a Jesus, e lembrar-nos que ele é o único por quem o mundo foi feito e para quem o mundo foi feito. O grande autor de tudo isso é aquele a quem Jesus orou dizendo “Abba”. Por esta razão, em Jesus podemos começar a conhecer Deus como nosso Abba Pai e experimentar sua presença paternal junto a nós, e com isso nos aproximarmos do mistério, que é orar.
N. T. Wright é bispo anglicano de Durham, Inglaterra e autor de mais de trinta livros, entre eles estão o Simplesmente cristão, lançado pela Ultimato e a famosa série de comentários do NT, For Everyone.
Winn Collier é pastor na Downtown Community Fellowship em Clemson, Carolina do Sul, Estados Unidos, e autor de Let God.