Perdão
Henri Nouwen,
que define o perdão como "amor praticado entre pessoas que amam
defeituosamente", descreve como o processo do perdão funciona:
"Digo com
frequência: 'Eu perdoo você'. Mas, mesmo quando digo essas palavras, meu
coração continua zangado ou ressentido. Ainda quero ouvir a história que me diz
que eu estava certo, afinal de contas; ainda quero ouvir pedidos de desculpas e
justificativas; ainda quero ter a satisfação de receber algum louvor em troca —
pelo menos o louvor de ser tão perdoador!
O perdão de Deus,
contudo, é incondicional; ele vem de um coração que não exige nada para si
mesmo, um coração que está completamente vazio de interesses próprios. É o
perdão divino que tenho de praticar em minha vida diária. Ele me convoca para
continuar passando por cima de todos os meus argumentos que dizem que o perdão
é loucura, doentio e impraticável. Ele me desafia a passar por cima de toda a
minha necessidade de gratidão e elogios. Finalmente, ele exige de mim que eu
passe por cima daquela parte ferida do meu coração que se sente machucada e
maltratada e que deseja ficar no controle e colocar algumas condições entre mim
e a pessoa a qual sou solicitado a perdoar.
Um dia descobri estas
advertências do apóstolo Paulo aninhada entre muitas outras em Romanos 12.
Aborrecei o mal, alegrai-vos, sede unânimes, não sejais sábios em vós mesmos —
e a lista prossegue. Então aparece este versículo: "Não vos
vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar a ira, pois está escrito:
Minha é a vingança; eu retribuirei, diz o Senhor".
Finalmente, entendi:
em última análise, o perdão é um ato de fé. Perdoando outra pessoa, estou
confiando que Deus é um juiz melhor do que eu. Perdoando, abandono meus
próprios direitos de me vingar e deixo toda a questão da justiça nas mãos
divinas. Deixo nas mãos de Deus a balança que deve pesar a justiça e a
misericórdia.
Quando José,
finalmente, chegou ao ponto de perdoar seus irmãos, a dor não desapareceu, mas
o fardo de ser o juiz se desfez. Embora o mal não desapareça quando perdoo, ele
perde o seu poder sobre mim e é assumido por Deus, que sabe muito bem o que
fazer. Tal decisão envolve risco, naturalmente: o risco de Deus não lidar com a
pessoa como eu gostaria (o profeta Jonas, por exemplo, ressentiu-se porque Deus
foi mais misericordioso do que os ninivitas mereciam).
Eu nunca achei que o
perdão é fácil, e raramente o considero completamente satisfatório. As
injustiças importunas continuam, e as feridas ainda doem. Tenho de me aproximar
de Deus repetidas vezes, entregando a Ele os resíduos do que pensava ter-lhe
entregue há muito tempo. Ajo dessa forma porque os evangelhos tornam clara a
conexão: Deus perdoa minhas dívidas como eu perdoo meus devedores. O inverso
também é verdadeiro: apenas vivendo na correnteza da graça de Deus encontrarei
forças para reagir com graça para com os outros.
Um cessar-fogo entre os seres
humanos depende de um cessar-fogo com Deus".
Henri Nouwen