quarta-feira, dezembro 16, 2009

A IGREJA EVANGÉLICA É LEGITIMADORA DA CORRUPÇÃO

A afirmação que se faz no título desse artigo fundamenta-se em cinco percepções acerca da presença da Igreja Evangélica na nação brasileira, relativamente a sua atuação.
Em primeiro lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque não a denuncia. Não concebe que deva encarnar a função profética, relega ao segundo plano as questões sócio-políticas, e não se manifesta sobre aquela que é a maior manifestação do mal nas terras brasileiras: a corrupção. Não há denúncia.
Em segundo lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque sua ação social substitui a ação do Estado, não denuncia a situação e não exige que o Poder Público desempenhe suas obrigações. Se por um breve momento a Igreja Evangélica Brasileira deixasse de realizar suas ações de assistência social, o País se tornaria um caos, imediatamente. A distribuição da renda, consubstanciada na distribuição de cestas básicas e demais ações similares, a recuperação e inserção social, consubstanciadas nos trabalhos das inúmeras casas de recuperação, a promoção do ensino, por intermédio de milhares de escolas confessionais, o cuidado com a criança, realizado por creches e pela própria Escola Dominical, tudo isso, são funções do Estado negligente que não as realiza. Na medida em que a Igreja Evangélica faz tudo isso – e jamais deve deixar de fazer – sem a devida e obrigatória participação do Estado, e não denuncia a gravidade do fato, está sendo cúmplice de governantes e parlamentares criminosos, que utilizam em benefício próprio os recursos que deveriam ser destinados a essas atividades.
Em terceiro lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque se associa ao Poder Público sem a crítica adequada. Seus líderes sobem nos palanques políticos, impõem as mãos sobre as cabeças de gente cujo pensamento está voltado apenas para seus próprios interesses e para o crime, dá e recebe condecorações de e para gente sem a menor credencial ética para isso, cede os púlpitos a bandidos, enfim, associa-se a gente que deveria estar presa, mas que usufrui da liberdade que o seu poder lhes permite adquirir. Aqueles que deveriam ser alvo de denúncia e profetismo por parte da Igreja são seus grandes amigos e aliados.
Em quarto lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque não desenvolve ações consistentes de combate à corrupção. E nem poderia ser diferente, visto que ela nem mesmo a denuncia. Enfrentar esse mal é obrigação, mas nada faz a respeito.
Em quinto lugar, a Igreja Evangélica Brasileira é legitimadora da corrupção porque a pratica desavergonhadamente.
À denúncia acima pronunciada segue-se, necessariamente, a proposta de ação.
1. Para denunciar a corrupção nos púlpitos, e perante a nação, obrigação inadiável da Igreja Evangélica Brasileira, é necessário colocar ordem dentro de casa: transparência das contas. Igrejas precisam publicar seus balancetes e prestar contas do que fazem com os dinheiros de seus membros, se quiserem ter credibilidade e autoridade para profetizar contra o mau uso dos recursos pelo Poder Público. Os líderes de igreja não podem submeter-se apenas à prestação de contas – inevitável e certa – diante de Deus. Precisam entender o momento em que o País se encontra e dar o exemplo. Transparência, eis a exigência.
2. A Igreja não pode deixar de fazer ação social, mas tem que cobrar a ação do Governo, o emprego das verbas públicas nos programas sociais e as ações que promovam a distribuição de renda. Precisa-se, antes de mais nada, de informações acerca de todo o esforço que a Igreja Evangélica Brasileira está fazendo para amenizar a situação de dificuldade em que vive grande parte da nação. O Governo tem que conhecer a enorme dimensão dessas ações, e seu alcance. Trabalho que dá credibilidade para cobrar do Governo que faça a sua parte, em particular impedindo que o dinheiro público seja desviado para atender a interesses privados. A Igreja não pode substituir a ação do Estado, como ocorre hoje; esse esforço tem que ser complementar. O Estado tem a obrigação de zelar por seus cidadãos, a Igreja, de amar o próximo. O trabalho da Igreja não exime o Estado de sua responsabilidade. No entanto, a última coisa que se deve pleitear é a parceria na qual as igrejas recebam mais verbas públicas para a realização de ações de cunho social. Há generosidade e recursos suficientes para contribuir com as obras das Igrejas. Não se rejeitam parcerias com o Poder Público, mas elas só podem se estabelecer fundamentadas em sólidos sistemas de controle e transparência. Em parceria com o Poder Público, a Igreja tem demonstrado que é engolida pelo mesmo mal que assola a Nação.
3. Não há outra possibilidade, nesse momento, senão o rompimento radical com as práticas que a Igreja Evangélica Brasileira tem adotado em relação aos seus representantes no Poder Executivo e no Poder Legislativo. Se eles querem ir às igrejas, ou se mesmo já são membros, que se assentem nos bancos e ouçam, em silêncio. Se quiserem conversar com esse povo sobre política, que se marquem reuniões específicas para isso, e que nunca se tratem tais assuntos em cultos. Não se pode mais chamá-los aos púlpitos e impor sobre eles as mãos, manipulando a compreensão dos membros. Se querem oração que recebam-na nos gabinetes, pois o Deus que ouve em secreto em secreto os responderá. Pastores não devem receber condecorações das mãos de criminosos travestidos de prefeitos e parlamentares, há que se ter o mínimo de decência e discernimento.
4. A Igreja precisa adentrar o espaço público aberto a ela e a toda a comunidade. Participar dos Conselhos Municipais de Políticas Públicas criados por lei para exercer o controle das ações públicas em áreas como a educação, a saúde e a assistência social, entre outras. Pastores devem incentivar seus membros a participar, promover treinamento para eles, e facilitar-lhes o acesso a estas instâncias de participação política. Fazendo isso, a Igreja estará garantindo a merenda escolar para seus próprios filhos – e demais crianças de suas cidades, o salário adequado para os professores, os recursos para as entidades de assistência social, os programas de enfrentamento de moléstias, o dinheiro para a farmácia básica, entre tantas outras possibilidades. A legislação brasileira tem criado esses conselhos, dos quais devem fazer parte representantes da sociedade civil organizada. Espaço absolutamente adequado para a ação consistente da entidade que mais faz ação social nesse País, a Igreja Evangélica Brasileira.
5. Quanto à participação na corrupção desenfreada nesse País, já conhecida há tanto tempo, e vergonhosamente evidenciada, por exemplo, na CPMI dos Sanguessugas, é necessário, em arrependimento e quebrantamento, pedir perdão. Pedir perdão a Deus e à Nação, pois esperava-se muito mais da Igreja Evangélica Brasileira.Sobre ela pesa duro juízo, por suas ações, por sua acomodação, por sua omissão cúmplice. Pois, ao invés de destruir as obras do diabo, tornou-se partícipe delas.

Henrique Moraes Ziller - membro da Igreja Metodista da Asa Sul, em Brasília – DF, é Auditor Federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União e Presidente do Instituto de Fiscalização e Controle (www.adoteummunicipio.org.br).

Evangélicos não reformados!

O jornal “Correio Brasiliense” (17/10/04) trouxe a manchete “Pratico esportes, danço. Sou pastor”. A reportagem começava assim: “As maiores igrejas evangélicas que atuam no país abriram os olhos. Para arrebanhar o maior número possível de fiéis, resolveram modernizar”. Um turbilhão de reações à matéria aconteceu nestes últimos dias. Evangélicos ofendidos! Deputados distritais usaram a tribuna da Assembléia Legislativa a fim de ‘defender a honra’ evangélica! Não li nenhuma reação de confissão de pecados! A “igreja evangélica brasileira” está mesmo com sérios problemas: não consegue perceber que está se modernizando mesmo!

Esta modernização evangélica está cada vez mais distanciando a igreja dos princípios norteadores da Reforma Protestante do século XVI.

Em primeiro lugar, muitos dos evangélicos de hoje têm uma visão das Escrituras inferior à que a igreja de Roma tinha no século XVI. Instituições evangélicas de peso duvidam da confiabilidade da Bíblia e de sua infalibilidade. Outros acreditam que a Bíblia é inerrante, porém acrescentam novas regras e revelações ao cânon. "A Bíblia é suficiente", nos aconselhariam os reformadores.

Em segundo lugar, muitos evangélicos modernos também não acreditam que Cristo é suficiente. Às vezes pessoas muito boas e nobres substituem Cristo como nosso único Mediador. Às vezes, nós temos mediadores humanos que não são o Deus-Homem Jesus Cristo. Precisamos de outras coisas pelo meio, como a figura do pastor, do bispo, do apóstolo, ‘do profeta’. É só ligarmos a TV ou rádio nos ‘programas evangélicos’ e tentarmos encontrar a pregação do Cristo crucificado e ressurrecto, e nos sentiremos frustrados! Jesus, literalmente, ‘saiu de cena’. Enquanto estivermos neste assunto, também deveríamos mencionar que foi a venda de indulgências de John Tetzel (redução do período no purgatório em troca de valores em dinheiro) que inspirou as "Noventa e Cinco Teses" de Martinho Lutero, desencadeando a Reforma. "Quando a moeda bate no cofre", o coro cantava, "uma alma do purgatório é vivificada". Será que isso realmente é diferente da venda da salvação que temos visto na televisão, rádio, e mesmo em muitas igrejas? Dinheiro e salvação têm sido distorcidos para serem uma coisa só no meio de muitos de nós. "Eles vendem salvação a você", canta Ray Stevens, "enquanto eles cantam 'Amazing Grace' ('Graça Maravilhosa')".

Muitos evangélicos hoje crêem que "Somente a Graça" (sola gracia) é algo como livre-arbítrio, uma decisão, uma oração, uma ida até a frente, uma segunda bênção, algo que nós façamos por Deus que nos dará confiança de sermos alvo do Seu favor. Doutrinas como eleição, justificação e regeneração são discutidas quase que nunca, porque elas mostram o quadro de uma humanidade que é incapaz e nem ao menos pode cooperar com Deus em matéria de salvação.

E sobre "Somente a Fé" (sola fide)? Muitos evangélicos acham que a fé não é suficiente. Alguns insistem que a fé mais a entrega, ou a fé mais a obediência, ou fé mais um sincero desejo de servir ao Senhor servirão como uma fórmula. O fato de que os evangélicos hoje lutam com estas questões indica que nós não ouvimos o "som seguro" de "Somente a Fé" em nossas igrejas. A Fé é suficiente porque Cristo é suficiente.

Como se comparariam os evangélicos de hoje com os seus predecessores em matéria de "Somente a Deus seja a Glória"? Auto-estima, glória-própria, centralidade do "eu" parecem dominar a pregação, ensino e a literatura popular do mundo evangélico. Os evangélicos de hoje sabem muito pouco do grande Deus dos reformadores - um Deus que faz tudo conforme o Seu agrado, em relação aos céus e às pessoas sobre a terra e "que faz tudo conforme o conselho da Sua vontade" (Dn. 4; Ef. 1: 11). Os evangélicos hoje se prostram com temor diante de Deus pela consciência de Sua Soberania? Hoje a busca é pela emoção, prazer, pela experiência, pelo ‘suor’! Louvar ao Deus de uma experiência pessoal, de uma emoção, da ‘preferência pessoal’, contudo, é na verdade louvar um ídolo. Os reformadores levavam muito a sério a Glória de Deus, e aqueles que quiserem ser “evangélicos genuínos” também devem fazê-lo.

Muitas pessoas se perguntam por que o povo da "Reforma" parece ser “ranzinza”. Lutero, Calvino, Melanchton, Farel, Beza, Knox e Zwinglio realmente não eram ‘populares’. Não eram ‘ranzinzas’, nem amuados, mas não trocavam a verdade das Sagradas Escrituras pelos aplausos dos ouvintes, nem tampouco a Glória de Deus pela autopromoção. Ora, ninguém quer estar ao redor de pessoas ranzinzas e amuadas - e eu não gostaria de ser conhecido como uma pessoa assim. Mas precisamos encarar o fato de que estes são tempos de grande infidelidade e de excessivas ‘modernizações’ no seio da igreja. A nós foi dada uma fé rica, com Cristo no centro. Porém trocamos nossa rica dieta por um saco de pipocas e, por isso, estamos mal nutridos. Se nós ‘evangélicos da atualidade’ quisermos saúde espiritual, teremos que voltar para as verdades que fazem de "evangélicos" "evangélicos reformados". A Bíblia - nosso único fundamento; Cristo - nossa única esperança; Graça - nosso único evangelho; Fé - nosso único instrumento; a Glória de Deus - nosso único alvo; o Sacerdócio de todos os santos - nosso único ministério. Este evangelicalismo original ainda é –é sempre será– suficiente para fazer, mesmo de nossas menores vitórias, algo muito grande.

Rev. Ézio Martins de Lima

Traduzido e adaptado do texto do Dr.Michael Horton, professor

no Seminário Teológico Reformado, Orlando-Flórida.