Jürgen Moltmann (com o diploma) recebeu o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Metodista de São Paulo
Um dos teólogos europeus mais profícuos e inovadores da atualidade visitou o Brasil em novembro. Figura das mais representativas da teologia protestante contemporânea, autor europeu mais lido nos seminários brasileiros e pai da chamada Teologia da Esperança, o alemão Jürgen Moltmann costuma ter seu nome precedido por muitos superlativos, sobretudo por aqueles que conhecem sua extensa obra. Caso de Levy Bastos, professor da Faculdade de Teologia da Universidade Metodista de São Paulo (Umesp), que recebeu Moltmann e lhe concedeu o título de Doutor Honoris Causa: “Trata-se de um estudioso que vem marcando gerações inteiras com suas idéias”, destaca.
Do alto de seus 82 anos de vida, o escritor, pastor e professor Jürgen Moltmann concedeu uma entrevista a CRISTIANISMO HOJE durante esta sua segunda – e, provavelmente, última – estada no país. Ele falou aos participantes de um congresso de teologia e lançou o livro Testamento teológico para a América Latina. Com um jeito naturalmente singelo e discurso cadenciado, Moltmann falou por quase uma hora e mostrou porque tem tamanha credibilidade. Boa parte de sua construção teológica tem por base a experiência pessoal, como o período de três anos em que foi prisioneiro de guerra, entre os anos de 1945 e 1948. Ex-integrante da Força Aérea Alemã, ele foi capturado pelas forças aliadas e mantido preso na Bélgica e na Inglaterra. “Foi quando clamei: ‘Meu Deus, onde estás?’. Desde então, fui perseguido pela pergunta básica acerca do porquê de estar vivo e de qual o sentido de minha existência”, lembra.
De volta à Alemanha, Moltmann foi estudar teologia para obter respostas. Em 1964, lançou Teologia da esperança, livro que o projetaria no cenário teológico mundial e se tornaria sua obra-prima. A obra defende uma esperança que deve ir além do sentimento de resignação que projeta uma existência melhor somente na vida eterna, mas preconiza uma luta para transformar o mundo atual num lugar mais humano e justo. “Isso rompeu o paradigma tradicional da teologia européia da época”, salienta Levy Bastos.
Partido pelos pobres – De fato, Teologia da esperança superou o pensamento de Ernst Bloch (autor de O princípio da esperança). A meta da missão cristã pregada por Moltmann não se limita simplesmente à ênfase na salvação individual, pessoal, mas à realização da esperança da justiça, da socialização de humanidade e da paz do mundo. Esse pensamento ganhou novos contornos em 1972, com O Deus crucificado, livro no qual Moltmann elabora uma teologia da cruz, baseada na premissa de que “um Deus incapaz de sofrer é também incapaz de amar”. Para o teólogo alemão, tal sofrimento não é imposto de fora – visto que Deus é imutável –, mas sim um sofrimento de amor, livre, de um Senhor que sofre diante de tragédias como (novamente por influência de sua vivência na Segunda Guerra) Auschwitz e o extermínio dos judeus.
Com base nesse pensamento, Moltmann rebate a grande pergunta de Emanuel Lévinas – “Como falar de Deus depois de Auschwitz?” – com a seguinte provocação: “De quê, então, é para falar depois de Auschwitz, senão de Deus”? Segundo ele, como as pessoas, em sua maioria, são vítimas e não opressoras, é necessário vivenciar uma cristologia que pronuncie claramente que Jesus está ao lado das vítimas, e que Deus fará justiça. Já em A Igreja no poder do Espírito
Numa linha de pensamento vanguardista para sua época, o teólogo preconizava uma Igreja ecumênica, que quebrasse as barreiras entre as denominações e também na política. Moltmann, aliás, foi um dos principais inspiradores da Teologia da Libertação, movimento que ganhou força, inclusive no Brasil, nos anos 1960 e 70, pregando uma Igreja que tomasse partido pelos pobres e humilhados deste mundo. Sua identificação com os mais humildes pode ser percebida quando fala de si mesmo: “Sou apenas um simples cristão que busca entender sua fé. Nada além disso”. (1975), são exploradas, com viés fortemente ecumênico, as implicações eclesiásticas dessa teologia. “A Igreja deve estar aberta a Deus, aos homens e ao futuro, tanto de Deus quanto dos homens”, escreveu Moltmann. “Isso pede da Igreja não uma simples adaptação às rápidas mudanças sociais, mas uma renovação interior pelo Espírito de Cristo”.
Por Daniel Machado - Publicado no sítio:
http://www.cristianismohoje.com.br/retrancas/Doutor%20da%20esperan%E7a/37116
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