segunda-feira, dezembro 08, 2008

A Disciplina do Jejum

Haja vista muitos questionamentos sobre a disciplina do Jejum, estou postando um ótimo texto sobre o assunto.

Boa leitura! E um bom Jejum a todos, especialmente neste final de ano... quando os banquetes seduzem os olhos e provocam tanto o pecado da glutonaria!

Um forte e amoroso abraço a todos,

No amor dAquele que nos amou primeiro,

Ézio, pr

 

A Disciplina do Jejum

Richard Foster (do livro Celebração da Disciplina)

 

“Algumas pessoas têm exaltado o jejum religioso elevando-o além das Escrituras e da razão; e outras o têm menosprezado por completo.” - João Wesley

 

Em uma cultura onde a paisagem está pontilhada de restaurantes de todos os tipos, o jejum parece fora de lugar, fora de passo com os tempos. Com efeito, o jejum tem estado em geral descrédito, tanto dentro como fora da igreja, por muitos anos. Por exemplo, em minha pesquisa não consegui encontrar um único livro publicado sobre o jejum, de 1861 a 1954, um período de quase cem anos.

Mais recentemente desenvolveu-se um renovado interesse pelo jejum, muito embora ele seja freqüentemente dogmático e carente de equilíbrio bíblico.

Que é que explicaria este quase total menosprezo por um assunto mencionado com tanta freqüência nas Escrituras e tão ardorosamente praticado pelos cristãos através dos séculos? Duas coisas. Em primeiro lugar, o jejum, como resultado das excessivas práticas ascéticas da Idade Média, adquiriu uma péssima reputação. Com o declínio da realidade interior da fé cristã, desenvolveu-se uma crescente tendência para acentuar a única coisa que sobrou, a forma exterior. E sempre que existe uma forma destituída de poder espiritual, a lei assume o comando porque ela sempre traz consigo um senso de poder manipulador.

Daí que o jejum foi submetido aos mais rígidos regulamentos e praticado com extrema automortificação e flagelação. A cultura moderna reagiu fortemente contra esses excessos e tendeu a confundir jejum com mortificação.

O segundo motivo por que o jejum passou por tempos difíceis no século passado é a questão da propaganda. A publicidade com a qual somos alimentados hoje convenceu-nos de que se não tomarmos três boas refeições por dia, entremeadas com diversas refeições ligeiras, corremos o risco de morrer de fome. Isto, aliado à crença popular de que é uma virtude positiva satisfazer a todo apetite humano, fez que o jejum parecesse obsoleto. Quem quer que seriamente tente jejuar é bombardeado com objeções. “Entendo que o jejum é prejudicial à saúde.”

“Ele minará as suas forças e assim você não poderá trabalhar.” “Não destruirá ele o tecido saudável do corpo?” Tudo isto, naturalmente, é rematada tolice baseada no preconceito. Embora o corpo humano possa sobreviver apenas durante breve tempo sem ar ou sem água, ele pode passar muitos dias - em geral, cerca de quarenta - antes que comece a inanição. Sem que seja preciso concordar com as infladas alegações de alguns grupos, não é exagero dizer que, quando feito corretamente, o jejum pode ter efeitos físicos benéficos.

A Bíblia tem tanto que dizer a respeito do jejum, que faríamos bem em examinar uma vez mais esta antiga Disciplina. O rol dos personagens bíblicos que jejuavam torna-se um “Quem é quem” das Escrituras: Moisés, o legislador; Davi, o rei; Elias, o profeta; Ester, a rainha; Daniel, o vidente; Ana, a profetisa; Paulo, o apóstolo; Jesus Cristo, o Filho encarnado. Muitos dos grandes cristãos através da história da igreja jejuaram e deram seu testemunho sobre o valor do jejum; entre eles estavam Martinho Lutero, João Calvino, John Knox, João Wesley, Jonathan Edwards, David Brainerd, Charles Finney e o Pastor Hsi, da China.

O jejum, está claro, não é uma Disciplina exclusivamente cristã; todas as grandes religiões do mundo reconhecem seu mérito. Zoroastro praticava o jejum, como o fizeram Confúcio e os iogues da Índia. Platão, Sócrates e Aristóteles jejuavam. Mesmo Hipócrates, pai da medicina moderna, acreditava no jejum. Ora bem, o fato de que todos esses indivíduos, na Bíblia e fora dela, tinham o jejum em alta conta não o torna certo ou mesmo desejável; isto porém, deveria levar-nos a fazer uma pausa e nos dispormos a reavaliar as suposições populares de nosso tempo concernentes à Disciplina do jejum.

O Jejum na Bíblia

Nas Escrituras o jejum refere-se à abstenção de alimento para finalidades espirituais. Ele se distingue da greve de fome, cujo propósito é adquirir poder político ou atrair a atenção para uma boa causa. Distingue-se, também, da dieta de saúde, que acentua a abstinência de alimento, mas para propósitos físicos e não espirituais. Devido à secularização da sociedade moderna, o “jejum” (se de algum modo praticado) é motivado ou por vaidade ou pelo desejo de poder. Isto não quer dizer que essas formas de “jejum” sejam necessariamente erradas, mas que seu objetivo difere do jejum descrito nas Escrituras. O jejum bíblico sempre se concentra em finalidades espirituais.

Na Bíblia, os meios normais de jejuar envolviam abstinência de qualquer alimento, sólido ou líquido, excetuando-se a água. No jejum de quarenta dias de Jesus, diz o evangelista que ele “nada comeu” e ao fim desses quarenta dias “teve fome”, e Satanás o tentou a comer, indicando que a abstenção era de alimento e não de água (Lucas 4.2ss). De uma perspectiva física, isto era o que geralmente estava envolvido num jejum.

Às vezes se descreve o que poderia ser considerado jejum parcial; isto é, há restrição e dieta mas não abstenção total. Embora pareça que o jejum normal fosse prática costumeira do profeta Daniel, houve uma ocasião em que, durante três semanas, ele não comeu “manjar desejável, nem carne nem vinho entraram na minha boca, nem me untei com óleo algum” (Daniel 10.3). Não somos informados do motivo para este afastamento de sua prática normal de jejuar; talvez seus deveres governamentais o obstassem.

Há, também, diversos exemplos bíblicos do que se tem chamado acertadamente “jejum absoluto”, ou abstenção tanto de alimento como de água. Parece ser uma medida desesperada para atender a uma emergência extrema. Após saber que a execução aguardava a ela e ao seu povo, Ester instruiu a Mordecai: “Vai, ajunta a todos os judeus... e jejuai por mim, e não comais nem bebais por três dias, nem de noite nem de dia; eu e as minhas servas também jejuaremos” (Ester 4.16).

Paulo fez um jejum absoluto de três dias após seu encontro com o Cristo vivo (Atos 9.9). Considerando-se que o corpo humano não pode passar sem água muito mais do que três dias, tanto Moisés como Elias empenharam-se no que deve considerar-se jejuns absolutos sobrenaturais de quarenta dias (Deuteronômio 9.9; 1 Reis 19.8). É preciso sublinhar que o jejum absoluto é a exceção e nunca deveria ser praticado, a menos que a pessoa tenha uma ordem muita clara de Deus, e por não mais do que três dias.

Na maioria dos casos, o jejum é um assunto privado entre o indivíduo e Deus.

Há, contudo, momentos ocasionais de jejuns de um grupo ou públicos. O único jejum público anual exigido pela lei mosaica era realizado no dia da expiação (Levítico 23.27). Era o dia do calendário judaico em que o povo tinha o dever de estar triste e aflito como expiação por seus pecados. (Aos poucos foram-se adicionando outros dias de jejum, até que hoje há mais de vinte!) Os jejuns eram convocados, também, em tempos de emergência de grupo ou nacional: “Tocai a trombeta em Sião, promulgai um santo jejum, proclamai uma assembléia solene” (Joel 2.15). Quando o reino de Judá foi invadido, o rei Josafá convocou a nação para jejuar (2 Crônicas 20.1-4). Em resposta à pregação de Jonas, toda a cidade de Nínive jejuou, inclusive os animais - involuntariamente, sem dúvida. Antes do retorno a Jerusalém, Esdras fez os exilados jejuar e orar por segurança na estrada infestada de salteadores (Esdras 8.21-23).

O jejum em grupo pode ser uma coisa maravilhosa e poderosa, contanto que haja um povo preparado e unânime nessas questões. Igrejas ou outros grupos que enfrentam sérios problemas poderiam ser substancialmente beneficiados mediante oração e jejum de grupo unificado. Quando um número suficiente de pessoas entende corretamente do que se trata, as convocações nacionais à oração e jejum podem, também, ter resultados benéficos. Em 1756 o rei da Inglaterra convocou um dia de solene oração e jejum por causa de uma ameaça de invasão por parte dos franceses. João Wesley registrou este fato em seu Diário, no dia 6 de fevereiro:

“O dia de jejum foi um dia glorioso, tal como Londres raramente tem visto desde a Restauração. Cada igreja da cidade estava mais do que lotada, e uma solene gravidade estampava-se em cada rosto. Certamente Deus ouve a oração, e haverá um alongamento de nossa tranqüilidade.”

Em uma nota ao pé da página ele escreveu: “A humildade transformou-se em regozijo nacional porque a ameaça de invasão dos franceses foi impedida.”

Através da história também se desenvolveu o que poderia chamar-se de jejuns regulares. Na época de Zacarias foram criados quatro jejuns regulares (Zacarias 8.19). A jactância do fariseu da parábola de Jesus evidentemente descrevia uma prática daquele tempo: “jejuo duas vezes por semana” (Lucas 18.12). O Didaquê insistia em dois jejuns semanais, nas quartas e nas sextas-feiras. O jejum regular tornou-se obrigatório no Segundo Concílio de Orleans, no sexto século.

João Wesley procurou reviver o ensino do Didaquê e insistiu com os primitivos metodistas a que jejuassem nas quartas e nas sextas-feiras. Com efeito, ele tinha um sentimento tão forte quanto a este assunto, que se recusava a ordenar para o ministério metodista, quem não jejuasse nesses dias.

O jejum regular ou semanal teve efeito tão profundo na vida de alguns que eles andavam à procura de um mandamento bíblico sobre o assunto, de sorte que pudessem impô-lo a todos os cristãos. A busca foi em vão. Simplesmente não existem leis bíblicas que ordenem o jejum regular. Contudo, nossa liberdade no evangelho não significa licença, mas oportunidade. Visto que não há leis que nos obriguem, somos livres para jejuar em qualquer dia. Para o apóstolo Paulo a liberdade significa que ele estava engajado em “jejuns muitas vezes” (2 Coríntios 11.27). Devemos sempre ter em mente o conselho apostólico: “Não useis da liberdade para dar ocasião à carne” (Gálatas 5.13).

Há, hoje, uma “disciplina” que tem adquirido certa popularidade, semelhante, mas não idêntica, ao jejum. Chama-se “vigílias”, proveniente do uso que Paulo faz do termo em conexão com seus sofrimentos por Cristo (2 Coríntios 6.5; 11.27). Refere-se à abstenção de dormir a fim de atender à oração ou outros deveres espirituais. Não há indicação de que isso tenha qualquer ligação central com o jejum; doutra forma, estaríamos limitados a jejuns muito breves!

Embora as “vigílias” possam ter valor, e Deus às vezes nos chama a passar sem dormir por necessidades específicas, devemos cuidar para que não elevemos à categoria de obrigações principais coisas que têm apenas levíssimo precedente bíblico. Deveríamos ter sempre diante de nós a advertência de Paulo, porque, em qualquer discussão de Disciplinas, descobriríamos muitas coisas que “... com efeito, têm aparência de sabedoria, como culto de si mesmo, e falsa humildade, e rigor ascético; todavia, não têm valor algum contra a sensualidade” (Colossenses 2.23).

É o Jejum um Mandamento?

Um problema que compreensivelmente preocupa muitas pessoas é saber se a Bíblia torna o jejum obrigatório ou não a todos os cristãos. Numerosas tentativas têm sido feitas para responder a esta questão, resultando numa variedade de conclusões. Uma das melhores respostas afirmativas foi elaborada em 1580, por Thomas Cartwright, em um livro que tem algo de clássico nesse campo, intitulado “The Holy Exercise of a True Fast” (O Sagrado Exercício do Jejum Verdadeiro).

Embora muitas passagens da Escritura tratem deste assunto, duas se destacam em importância. A primeira é o espantoso ensino de Jesus acerca do jejum, no Sermão do Monte. Dois fatores relacionam-se diretamente com o problema que temos em mão. O ensino de Jesus sobre o jejum estava diretamente no contexto de seu ensino sobre dar e orar. É como ser houvesse uma quase inconsciente suposição de que dar, orar e jejuar eram todos partes da devoção cristã. Não temos maior razão para excluir do ensino o jejum do que o temos para excluir o dar e o orar. Em segundo lugar, Jesus declarou: “Quando jejuardes...” (Mateus 6.16). Ele parecia admirado que as pessoas jejuassem, e o que faltava era instrução sobre como fazê-lo adequadamente. Martinho Lutero disse: “Não foi intenção de Cristo rejeitar ou desprezar o jejum... sua intenção foi restaurar o jejum adequado.”

Dito isto, entretanto, devemos admitir que as palavras de Jesus não constituem uma ordem. Jesus estava dando instruções sobre o exercício apropriado de uma prática comum no seu tempo. Ele não pronunciou uma só palavra sobre se era uma prática certa ou se deveria ser continuada. Jesus, portanto, não disse “Se jejuardes”, nem disse “Deveis jejuar”.

A segunda afirmativa crucial de Jesus acerca do jejum veio em resposta a uma pergunta dos discípulos de João Batista. Perplexos pelo fato de que tanto eles como os fariseus jejuavam, mas os discípulos de Jesus não, perguntaram “Por quê?” Jesus respondeu: “Podem acaso estar tristes os convidados para o casamento, enquanto o noivo está com eles? Dias virão, contudo, em que lhes será tirado o noivo, e nesses dias hão de jejuar” (Mateus 9.15). Esta é, talvez, a mais importante declaração do Novo Testamento sobre se os cristãos devem jejuar hoje.

Com a vinda de Jesus havia raiado um novo dia. O reino de Deus tinha vindo entre eles em poder. O Noivo encontrava-se no meio deles; era tempo de festejar, não de jejuar. Viria, contudo, um tempo para seus discípulos jejuarem, embora não no legalismo da antiga ordem.

A mais natural interpretação dos dias em que os discípulos de Jesus jejuarão é a presente era da igreja, especialmente à luz de sua intrincada conexão com a afirmativa de Jesus sobre os novos odres do reino de Deus que vem logo em seguida (Mateus 9.16-18). Arthur Willis argumenta que Jesus está se referindo à era presente da igreja, e não apenas ao período de três dias entre sua morte e ressurreição. Ele conclui seu argumento com estas palavras:

“Somos, portanto, compelidos a relacionar os dias de sua ausência com o período desta época, desde o tempo em que ele ascendeu ao Pai até que ele volte do céu.

Foi assim, evidentemente, que os apóstolos entenderam suas palavras, pois somente após suas ascensão ao Pai é que lemos de eles jejuarem (Atos 13.2,3).

Antes de o Noivo deixá-los, ele prometeu que voltaria de novo para recebê-los para si mesmo. A Igreja ainda aguarda o grito da meia-noite: 'Eis o noivo! Saí ao seu encontro' (Mateus 25.6). Esta época da Igreja é que é o período do Noivo ausente. A esta época da Igreja foi que nosso Mestre se referiu quando disse: 'e nesses dias hão de jejuar.’ O tempo é agora!”

 

Não há como escapar à força das palavras de Jesus nesta passagem. Ele deixou claro que esperava que seus discípulos jejuassem depois de sua partida. Embora as palavras não sejam proferidas na forma de uma ordem, isso é apenas um tecnicismo semântico. É evidente desta passagem que Cristo tanto apoiou a Disciplina do jejum como previu que seus seguidores o praticariam.

Talvez seja melhor evitar o termo “ordem”, visto que em sentido estrito Jesus não ordenou o jejum. Mas é óbvio que ele atuou segundo o princípio de que os filhos do reino de Deus jejuariam. Para a pessoa que anseia por um andar mais íntimo com Deus, essas declarações de Jesus são palavras atraentes.

Onde estão hoje as pessoas que responderão ao chamado de Cristo? Tornamo-nos tão acostumados à “graça barata” que instintivamente nos esquivamos aos apelos mais exigentes à obediência? “Graça barata é graça sem discipulado, graça sem a cruz.” Por que a contribuição em dinheiro, por exemplo, tem sido indiscutivelmente conhecida como elemento da devoção cristã e o jejum tão discutido? Certamente temos tanta evidência bíblica, se não mais, com relação ao jejum, quanto a temos com vistas a dar. Talvez em nossa sociedade afluente o jejum envolva um sacrifício muito maior do que dar dinheiro.

Objetivo do Jejum

É sensato reconhecer que a primeira declaração que Jesus fez acerca do jejum tratou da questão de motivos (Mateus 6.16-18). Usar boas coisas para nossos próprios fins é sempre sinal de falsa religião. Quão fácil é tomar algo como o jejum e tentar usá-lo para conseguir que Deus faça o que desejemos. Às vezes se acentuam de tal modo as bênçãos e benefícios do jejum que seríamos tentados a crer que com um pequeno jejum poderíamos ter o mundo, inclusive Deus, comendo de nossas mãos.

O jejum deve sempre concentrar-se em Deus. Deve ser de iniciativa divina e ordenado por Deus. Como a profetisa Ana, precisamos cultuar em jejuns (Lucas 2.37). Todo e qualquer outro propósito deve estar a serviço de Deus. Como no caso daquele grupo apostólico de Antioquia, “servindo ao Senhor” e “jejuando” devem ser ditos de um só fôlego (Atos 13.2). C. H. Spurgeon escreveu: “Nossas temporadas de oração e jejum no Tabernáculo têm sido, na verdade, dias de elevação; nunca a porta do céu esteve mais aberta; nunca nossos corações estiveram mais próximos da Glória central.”

Deus interrogou o povo do tempo de Zacarias: “Quando jejuastes... acaso foi para mim que jejuastes, como efeito para mim?” (Zacarias 7.5). Se nosso jejum não é para Deus, então fracassamos. Benefícios físicos, êxito na oração, dotação de poder, discernimentos espirituais - estas coisas nunca devem tomar o lugar de Deus como centro de nosso jejum. João Wesley declarou: “Primeiro, seja ele [o jejum] feito para o Senhor com nosso olhar fixado unicamente nele. Que nossa intenção aí seja esta, e esta somente, de glorificar a nosso Pai que está no céu...” Esse é o único modo de sermos salvos de amar mais a bênção do que Aquele que abençoa.

Uma vez que o propósito básico esteja firmemente fixo em nossos corações, estamos livres para entender que há, também, propósitos secundários em jejuar.

Mais do que qualquer outra Disciplina, o jejum revela as coisas que nos controlam. Este é um maravilhoso benefício para o verdadeiro discípulo que anseia ser transformado à imagem de Jesus Cristo. Cobrimos com alimento e com outras coisas boas aquilo que está dentro de nós, mas no jejum estas coisas vêm à tona. Se o orgulho nos controla, ele será revelado quase imediatamente. Davi disse: “em jejum está a minha alma” (Salmo 69.10). Ira, amargura, ciúme, discórdia, medo - se estiverem dentro de nós, aflorarão durante o jejum. A princípio racionalizaremos que a ira é devido à fome; depois descobriremos que estamos irados por causa do espírito de ira que há dentro de nós. Podemos regozijar-nos neste conhecimento porque sabemos que a cura está disponível mediante o poder de Cristo.

O jejum ajuda-nos a manter nosso equilíbrio na vida. Quão facilmente começamos a permitir que coisas não essenciais adquiram precedência em nossas vidas. Quão depressa desejamos ardentemente coisas das quais não necessitamos até que sejamos por elas escravizados. Paulo escreveu: “Todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma delas” (1 Coríntios 6.12). Nossos anseios e desejos humanos são como um rio que tende a transbordar; o jejum ajuda a mantê-lo no seu devido leito. “Esmurro o meu corpo, e o reduzo à escravidão”, disse Paulo (1 Coríntios 9.27). Semelhantemente, escreveu Davi:

“Eu afligia a minha alma com jejum” (Salmo 35.13). Isso não é ascetismo: é disciplina, e a disciplina traz liberdade. No século quarto Astério disse que o jejum garantia que o estômago não fizesse o corpo ferver como uma chaleira em prejuízo da alma.

Inúmeras pessoas têm escrito sobre os muitos outros valores do jejum tais como aumento de eficácia na oração intercessora, orientação na tomada de decisões, maior concentração, livramento dos que se encontram em escravidão, bem-estar físico, revelações e assim por diante. Nesta, como em todas as questões, podemos esperar que Deus galardoe os que diligentemente o buscam.

A Prática do Jejum

Homens e mulheres modernos ignoram, em grande parte, os aspectos práticos do jejum. Os que desejam jejuar precisam familiarizar-se com estas informações.

Como acontece com todas as Disciplinas, deve-se observar certa progressão; é prudente aprender a andar bem antes de tentarmos correr. Comece com um jejum parcial de vinte e quatro horas de duração; muitos têm achado que o melhor período é de almoço a almoço. Isto significa que você não tomaria duas refeições. Sucos de frutas frescas são excelentes. Tente este método uma vez por semana durante algumas semanas. No começo você ficará fascinado com os aspectos físicos, mas a coisa mais importante a observar é a atitude interior de adoração. Exteriormente você estará executando os seus deveres regulares do dia, mas interiormente você estará em oração e adoração, cântico e louvor. Numa forma nova, levará cada tarefa do dia a ser um ministério sagrado ao Senhor.

Conquanto seus deveres sejam seculares, para você eles são um sacramento.

Cultive uma “suave receptividade aos sopros divinos”. Quebre seu jejum com uma leve refeição de frutas e vegetais frescos e uma boa dose de regozijo íntimo.

Depois de duas ou três semanas, você estará preparado para tentar um jejum normal de vinte e quatro horas. Use somente água, mas em quantidades saudáveis.

Muitos acham que o melhor é água destilada. Se o gosto da água lhe desagrada, adicione uma colher de chá de suco de limão. Provavelmente você sentirá algumas dores de fome ou desconforto antes de terminar o tempo. Não se trata de fome verdadeira; seu estômago tem sido treinado durante anos de condicionamento a dar sinais de fome em determinadas horas. Em vários aspectos, seu estômago é como uma criança mimada, e as crianças mimadas não precisam de indulgência, precisam de disciplina. Martinho Lutero disse: “... a carne estava habituada a resmungar horrivelmente.” Você não deve ceder a este resmungo.

Ignore os sinais ou diga mesmo ao seu “filho mimado” que se acalme e em breve tempo as dores da fome terão passado. Se não, tome um copo de água e o estômago ficará satisfeito. Você tem que ser o senhor de seu estômago, e não seu escravo. Se os deveres de família o permitirem, devote à meditação e oração o tempo que você normalmente tomaria em alimentar-se.

Desnecessário é dizer que você deveria seguir o conselho de Jesus em refrear-se de chamar a atenção para o que você está fazendo. Os únicos a saber que você jejua são os que devem sabê-lo. Se você chama a atenção para seu jejum, as pessoas ficarão impressionadas e, como disse Jesus, essa será sua recompensa.

Você, porém, jejua por galardões muito maiores e grandiosos. As palavras abaixo foram escritas por um indivíduo que, a título de experimento, dedicou-se a jejuar uma vez por semana durante dois anos:

“1. Achei que foi uma grande realização passar um dia inteiro sem alimento.

Congratulei-me comigo mesmo pelo fato de achá-lo tão fácil.

2. Comecei a ver que o ponto acima referido dificilmente seria o alvo do jejum.

Nisto fui auxiliado por começar a sentir fome.

3. Comecei a relacionar o jejum de alimento com outras áreas de minha vida nas quais eu era mais exigente... Eu não me via obrigado a conseguir lugar no ônibus para estar contente, ou sentir-me refrescado no verão e aquecido quando fazia frio.

4. ... Refleti mais sobre o sofrimento de Cristo e sobre o sofrimento dos que estão com fome e têm filhinhos famintos. ...

5. Seis meses após principiar a disciplina do jejum, comecei a ver por que fora sugerido um período de dois anos. A experiência muda ao longo do caminho. A fome nos dias de jejum tornou-se aguda, e mais forte a tentação de comer. Pela primeira vez eu estava usando o dia a fim de encontrar a vontade de Deus para minha vida. Comecei a pensar sobre o significado de alguém render sua própria vida.

6. Agora sei que a oração e o jejum estão intimamente ligados, esta forma contudo ainda não está combinada em mim.”

 

Havendo realizado diversos jejuns com certo grau de êxito espiritual, passe para um jejum de trinta e seis horas: três refeições. Realizado isto, é hora de buscar o Senhor para saber se ele deseja que você prossiga num jejum mais longo. Três a sete dias é um bom período de tempo e provavelmente causará um forte impacto sobre o curso de sua vida.

É bom conhecer o processo pelo qual seu corpo passa no curso de um jejum mais longo. Os primeiros três dias são geralmente os mais difíceis em termos de desconforto físico e dores de fome. O corpo está começando a livrar-se dos venenos tóxicos que se acumularam durante anos de deficientes hábitos alimentares, e o processo não é nada confortável. Essa é a razão de sentir a língua grossa e mau hálito. Não se preocupe com esses sintomas; antes, seja grato por melhor saúde e bem-estar como resultado. Você pode sentir dores de cabeça durante esse tempo, principalmente se você é um ávido bebedor de café ou de chá. Esses são sintomas suaves do jejum que passarão, muito embora sejam desagradáveis por algum tempo.

No quarto dia as dores da fome começam a ceder, embora você tenha sensações de fraqueza e tontura. A tontura é apenas temporária, causada por mudanças súbitas de posição. Movimente-se com vagar e você não terá dificuldade. A fraqueza pode chegar ao ponto em que a mais simples tarefa demande grande esforço. Descansar é o melhor remédio. Muitos acham que este é o mais difícil período do jejum.

No sexto ou sétimo dia você começará a sentir-se mais forte e mais alerta. As dores de fome continuarão a diminuir até que nono ou décimo dia são apenas uma insignificante irritação. O corpo terá eliminado o grosso dos venenos tóxicos e você se sentirá bem. Seu senso de concentração estará aguçado e você achará que poderia continuar jejuando indefinidamente. Em termos físicos, esta é parte mais agradável do jejum.

Em algum ponto a partir do vigésimo-primeiro dia até ao quadragésimo, ou mais tempo ainda, dependendo do indivíduo, as dores de fome voltarão. Esta é a primeira fase da inanição e indica que o corpo esgotou todas as suas reservas excedentes e está começando a sacar sobre o tecido vivo. A esta altura o jejum deve ser quebrado.

A soma de peso perdido durante um jejum varia grandemente com o indivíduo. No começo é normal a perda de quase um quilo de peso por dia, diminuindo para quase meio quilo diário à medida que o jejum prossegue. Durante o jejum você sentirá mais frio, simplesmente porque o metabolismo do corpo não produz a soma costumeira de calor. Cuidando-se de manter o calor, não há dificuldade alguma.

Deve ser óbvio a todos que algumas pessoas há que, por motivos físicos, não devem jejuar. Os diabéticos, as mulheres grávidas e os que têm problemas cardíacos não devem jejuar. Se você tiver alguma dúvida sobre sua aptidão para jejuar, consulte um médico.

Antes de começar um jejum prolongado, alguns são tentados a comer uma boa dose de alimento com o intuito de formar “estoque”. Isto é muitíssimo imprudente; com efeito, refeições ligeiramente mais leves do que o normal são melhores para um dia ou dois anteriores ao jejum. Um bom conselho é que você se abstenha de tomar café ou chá três dias antes de começar um jejum longo. Se a última refeição a estar no estômago é de frutas e vegetais frescos, você não deve ter dificuldade com prisão de ventre.

Um jejum prolongado deve ser quebrado com suco de frutas ou de vegetais. A princípio, tomar pequenas quantidades. Lembre-se de que o estômago se contraiu consideravelmente e todo o sistema digestivo entrou numa espécie de hibernação.

No segundo dia você deve poder comer frutas, e depois leite ou iogurte. A seguir você pode comer saladas frescas e vegetais cozidos. Evite todo molho de salada, gordura ou amido. É preciso tomar o máximo cuidado para não comer em excesso. Uma boa coisa durante este período é considerar a dieta e hábitos alimentares futuros para ver se você precisa ser mais disciplinado e estar no controle de seu apetite.

Embora os aspectos físicos do jejum nos deixem curiosos, jamais devemos esquecer-nos de que a principal obra do jejum bíblico está no reino espiritual.

O que se passa espiritualmente é de muito maior conseqüência do que o que acontece no corpo. Você estará engajado em uma guerra espiritual que necessitará de todas as armas de Efésios 6. Um dos períodos mais críticos no campo espiritual está no final do jejum físico quando temos uma tendência natural para descontrair-nos. Não quero, porém, deixar a impressão de que todo jejum é uma tremenda luta espiritual; pessoalmente, não tenho sentido assim.

Ele é, também, “... justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo” (Romanos 14.17).

O jejum pode trazer avanços no reino espiritual que jamais poderiam ter acontecido de outra maneira. É um recurso da graça e bênção de Deus que não deve ser negligenciado por mais tempo. Wesley declarou:

“... não é meramente pela luz da razão... que o povo de Deus tem sido, em todos os tempos, levado a usar o jejum como um recurso: ... mas eles têm sido... ensinados a esse respeito pelo próprio Deus, mediante claras e abertas revelações de sua Vontade... Ora, quaisquer que tenham sido as razões para reavivar os do passado, em seu zeloso e constante cumprimento deste dever, elas são de igual força ainda para reavivar-nos.”

Agora é o tempo para que todos quantos ouvem a voz de Cristo obedeçam a ela.

 

 

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