terça-feira, setembro 18, 2007

Espiritualidade com todas as motivações erradas


Estou postando uma entrevista do Rev. Eugene Peterson, na qual ele fala sobre mentiras e ilusões que estão destruindo a igreja. A entrevista foi feita por Mark Galli, e foi publicada na Christianity Today. Março de 2005, Vol. 49, Nº 3, Página 42.
Vale a pena ler!!


Eugene Peterson tinha toda uma vida de publicações antes de escrever The Message (A Mensagem). E pode-se dizer que foram elas que conduziram, pelo menos em parte, à renovação atual da espiritualidade cristã entre pastores e leigos. Em livros como Five smooth stones for pastoral work (Cinco pedras lisas para o trabalho pastoral), Corra com os cavalos, A long obedience in the same direction: discipleship in an instant society (Uma longa obediência na mesma direção: discipulado em uma sociedade instantânea), e O pastor contemplativo, Peterson expôs a superficialidade do cristianismo estadunidense, e ofereceu uma alternativa estimulante e revigorante. Na mesma linha, Peterson volta a escrever sobre a vida cristã em Christ plays in ten thousand places: A conversation in spiritual theology (Cristo joga em dez mil lugares: Uma conversa sobre a teologia espiritual, Eerdmans, 2005). O livro é o primeiro de uma série planejada de cinco volumes, na qual Peterson sistematizará temas que ele abordou nas últimas três décadas – a formação espiritual, as Escrituras, liderança, a igreja, o pastoreio, o direcionamento espiritual. O primeiro volume é um tour de force em teologia espiritual, combinando uma análise cultural e exposição bíblica incisivas com uma visão extensa e atraente da vida cristã. Tudo o que Peterson escreve parte do seu trabalho como pastor, desenvolvido principalmente na igreja presbiteriana Christ our King em Bel Air, Maryland, um subúrbio de Baltimore. Ele foi o pastor fundador da igreja, que chegou a contar com 500 membros antes de ele a deixar, 29 anos depois. De lá ele foi para o Seminário Teológico de Pittsburgh, e depois para o Regent College, em Vancouver, British Columbia. Ele agora está “aposentado”, vivendo em sua casa em Montana, mas em seu coração continua sendo um pastor que se importa profundamente com a vida cristã no contexto da igreja local. Quando Peterson estava terminando de escrever Christ Plays in Ten Thousand Places, o editor gerente da revista Christianity Today, Mark Galli, conversou com ele sobre temas sugeridos pelo seu livro e pela sua vida.


Qual é o maior engano quando se fala em espiritualidade?
É achar que ela é uma espécie de forma especializada de ser cristão, que você precisa ter alguma espécie de poder. Isso é elitista. Muitas pessoas são atraídas à espiritualidade com motivações erradas. Outros tiram o corpo fora: “Eu não sou espiritual. Eu gosto de ir ao futebol, ou a festas, ou quero crescer na minha carreira”. Na verdade, eu tento evitar essa palavra.

Muitas pessoas supõem que espiritualidade é ficar emocionalmente íntimo de Deus.

Isso é uma visão ingênua da espiritualidade. Estamos falando de vida cristã. É seguir a Jesus. A espiritualidade é exatamente igual àquilo que fazemos a dois mil anos, ir à igreja e receber os sacramentos, ser batizados, aprender a orar, e ler as Escrituras da maneira correta. São as coisas normais. Essa promessa de intimidade é ao mesmo tempo correta e equivocada. Existe uma intimidade com Deus, mas é como qualquer outra intimidade; faz parte da substância da vida. No casamento você não se sente íntimo na maioria do tempo. Nem com um amigo. A intimidade não é, em primeiro lugar, uma emoção mística. É um modo de viver, uma abertura para a vida, honestidade, uma certa transparência.


A tradição mística não sugere o contrário?

Uma das minhas histórias favoritas é com Teresa de Ávila. Ela está sentada na cozinha com um frango assado. Ela segura o frango com as duas mãos, e simplesmente o devora. Uma das freiras entra e fica chocada com o que vê, com o comportamento dela. Teresa de Ávila diz: “Quando eu como frango, eu como frango; quando eu oro, eu oro”.

Se você ler sobre os santos, eles são pessoas normais. Eles têm momentos de arrebatamento e êxtase, mas isso é uma vez a cada 10 anos. E mesmo assim, quando acontece é uma surpresa. Eles não fizeram nada. Nós temos que desobrigar as pessoas dessas ilusões sobre o que é a vida cristã. É uma vida maravilhosa, mas não da maneira que muitos querem que ela seja.

Mas os evangélicos dizem às pessoas, corretamente, que elas podem ter um “relacionamento pessoal com Deus”. Isso sugere um certo tipo de intimidade espiritual.

Todas essas palavras são tão desgastadas em nossa sociedade. Se intimidade significa ser aberto, honesto e autêntico, não usar máscaras, ou não precisar ser defensivo e negar quem eu sou, isso é maravilhoso. Mas na nossa cultura, a intimidade tem conotações sexuais, uma espécie de completude. Então eu quero intimidade porque eu quero mais da vida. Raramente as pessoas pensam em sacrifício, em dar, em ser vulnerável. Isso são duas maneiras diferentes de ser íntimo. E no nosso vocabulário estadunidense, a intimidade geralmente está relacionada a conseguir alguma coisa do outro. Isso estraga tudo.

É muito perigoso usar a linguagem da cultura para interpretar o evangelho. O nosso vocabulário precisa ser refinado e testado pela revelação, pelas Escrituras. Nós temos um bom vocabulário e uma boa sintaxe, e é bom que nós comecemos a prestar atenção neles. Porque essa mania de usar palavras aleatoriamente, palavras de outros contextos, para conquistar os não cristãos, não é muito saudável.


Essa corrupção da palavra espiritualidade, mesmo nos meios cristãos, tem alguma coisa a ver com o movimento da Nova Era?

Essas coisas de Nova Era já são Velha Era. Já se fala nisso a um bom tempo. É um atalho barato para – acho que precisamos usar essa palavra – a espiritualidade. Significa evitar o comum, o cotidiano, o físico, o material. É uma forma de gnosticismo, e tem um apelo terrível, porque é uma espiritualidade que não tem nada a ver com lavar a louça, ou trocar fraldas, ou ir para o trabalho. Não existe muita integração com o trabalho, com as pessoas, o pecado, os problemas, as dificuldades.

Eu fui pastor grande parte da minha vida, durante mais ou menos 45 anos. Eu amo isso. Mas, para ser sincero, as pessoas que mais me dão trabalho são as que vêm me perguntar: “Pastor, como eu posso ser espiritual?” Esqueça esse negócio de ser espiritual. Que tal amar o seu marido? É um bom lugar para começar. Mas não é isso que eles querem. Que tal aprender a amar seus filhos, aceitá-los como são? O meu nome nem deveria estar ligado à espiritualidade. Mas ele está profundamente ligado. Eu sei. Então, alguns anos atrás, eu recebi o vergonhoso cargo de ser professor de “teologia espiritual” no Regent. E aí, fazer o quê?


Você faz a espiritualidade parecer tão mundana.

Eu não quero sugerir que as pessoas que seguem a Jesus nunca se divertem, que não há alegria, exuberância, êxtase. É só que essas coisas não são o que os consumidores acham que elas são. Quando nós fazemos propaganda do evangelho usando os valores do mundo, nós mentimos para as pessoas. Nós mentimos para elas, porque essa é uma vida nova. Ela envolve seguir a Jesus. Envolve a cruz. Envolve a morte, um sacrifício aceitável. Nós desistimos de nossas vidas.

O Evangelho de Marcos é uma boa imagem para isso. A primeira metade do Evangelho traz Jesus mostrando às pessoas como viver. Ele cura todo mundo. Então, bem na metade, ele muda. Ele começa a mostrar para as pessoas como morrer: “Agora que vocês têm a vida, eu vou mostrar para vocês como desistir dela”. É essa a vida espiritual. É aprender a morrer. E quando você aprende a morrer, você perde todas as suas ilusões, e você começa a ser capaz da verdadeira intimidade e do amor.

Isso envolve uma espécie de passividade aprendida, de modo que nosso relacionamento com os outros seja marcado, em primeiro lugar, por receber, nos submeter, em vez de dar, conseguir e fazer. Nós não conseguimos fazer isso muito bem. Nós fomos treinados para pensar positivo, para conseguir, aplicar, ou consumir e fazer.

Arrependimento, morrer para si mesmo, submissão... Não são ganchos muito atraentes para trazer pessoas à fé Eu acho que no momento que você coloca as coisas nesses termos, você vai ter problemas. Porque daí nós ficamos do mesmo lado do mundo consumidor, e tudo se torna um produto feito para dar alguma coisa a você. Nós não precisamos de mais nada. Nós não precisamos de algo melhor. O que nós queremos é vida. Estamos aprendendo a viver.

Eu acho que as pessoas estão de saco cheio de consumismo, mesmo que estejam viciadas nisso. Mas se nós apresentarmos o evangelho falando de benefícios, estamos preparando as pessoas para a decepção. Estamos mentindo.

Não foi desse jeito que as Escrituras foram escritas. Não foi assim que Jesus veio para estar entre nós. Não era isso que Paulo pregava. De onde a gente tira esse troço? Nós temos um manual. Temos as Escrituras. E a maioria do tempo estamos dizendo: “Vocês estão indo para o lado errado. Dêem meia volta. A cultura está envenenando vocês”.

Será que percebemos o quanto a cultura de Baal em Canaã está reproduzida exatamente na cultura da igreja estadunidense? A religião de Baal é aquilo que faz você se sentir bem. O culto a Baal é uma imersão total no proveito que eu posso tirar das coisas. E, é claro, era um sucesso tremendo. Os sacerdotes de Baal conseguiam juntar multidões que batiam os seguidores de Javé numa proporção de 20 para 1. Havia sexo, empolgação, música, êxtase, dança. “Nós temos mulheres aqui, amigos. Nós temos estátuas, mulheres e festas”. Era um negócio fantástico. E o que os hebreus tinham para oferecer? A Palavra. O que é a Palavra? Bom, pelo menos os Hebreus tinham festas!


Mesmo assim, o grande atrativo ou benefício da fé cristã é a salvação, não? “Creia no Senhor Jesus Cristo e você será salvo”. Não podemos usar isso para atrair legitimamente as pessoas?

É a melhor palavra que nós temos – salvação, ser salvo. Somos salvos de um modo de vida em que não havia ressurreição. E estamos sendo salvos de nós mesmos. Uma maneira de definir a vida espiritual é estar tão cansado e de saco cheio de você mesmo que você procura algo melhor, que é seguir a Jesus.

Mas no momento em que começamos a fazer propaganda da fé falando de benefícios, só estamos piorando o problema do ego. “Em Cristo, você é melhor, mais forte, mais agradável, você curte um êxtase”. Mas é só mais ego. Ao invés disso, nós queremos deixar as pessoas de saco cheio delas mesmas, para que comecem a olhar para Jesus. Todos nós conhecemos um tipo específico de pessoa espiritual. Ela é uma pessoa maravilhosa. Ela ama o Senhor. Ela ora e lê a Bíblia o tempo todo. Mas ela só pensa nela mesma. Ela não é uma pessoa egoísta. Mas ela sempre está no centro de tudo o que ela faz. “Como eu posso ser uma testemunha melhor? Como eu posso fazer isso melhor? Como eu posso resolver o problema dessa pessoa melhor?” É eu, eu, eu. Mas com um disfarce que torna difícil de enxergar a verdade, porque a conversa espiritual dela nos desarma.


Então como devemos enxergar a vida cristã?

No domingo passado, na igreja, havia um casal na nossa frente com duas crianças bagunceiras. Dois bancos atrás de nós, havia um outro casal, que também tinha dois filhos, e as crianças faziam muito barulho. Os membros da nossa igreja são principalmente gente mais velha. São pessoas que já viveram suas vidas. Os seus filhos já foram embora a um bom tempo. Então não foi um culto muito agradável; simplesmente não foi um bom culto. Mas quando terminou, eu vi meia dúzia dessas pessoas idosas ir até a mãe das crianças e abraçá-la, fazer carinho nas crianças, fazer amizade com ela. Eles podiam ter ficado irritados.

Agora, porque as pessoas vão a uma igreja assim quando poderiam ir a uma igreja que tenha creche, ar-condicionado, e tudo o mais? Bom, porque são luteranos. Eles não se importam em se sentir mal! Luteranos noruegueses!

E essa mesma igreja acolheu recentemente uma jovem com um bebê e um filho de três anos. As crianças foram batizadas a algumas semanas atrás, mas não tinha nenhum homem. Ela nunca se casou; cada uma das crianças é filho de um pai diferente. Ela aparece lá na igreja e quer batizar seus filhos. Ela é cristã, e quer seguir o caminho cristão. Então um casal da igreja assumiu o papel de padrinhos. Agora tem três ou quatro casais da igreja que todo domingo tentam se encontrar com ela.

Então, onde está a “alegria” daquela igreja? São noruegueses mal-humorados! Mas existe muita alegria. Há vida abundante ali, mas não abundante da maneira que um não cristão pensaria. Acho que tem muito mais coisa acontecendo em igrejas assim; elas são simplesmente tão contra-cultura. Elas são cheias de alegria, fidelidade, obediência e cuidado. Mas você certamente não ficaria sabendo disso lendo livros sobre crescimento de igrejas, não é?

Mas muitos cristãos olhariam para essa igreja e diriam que ela está morta, uma mera expressão institucional da fé. Que outra igreja existe além da institucional? Não existe ninguém que não tenha problemas com a igreja, porque existe pecado na igreja. Mas não existe nenhum outro lugar para ser cristão a não ser na igreja. Existe pecado no banco, existe pecado no armazém. Eu realmente não entendo essa critica ingênua à instituição. Não entendo. Frederick von Hugel disse que a instituição da igreja é como a casca da árvore. Não existe vida na casca. É madeira morta. Mas ela protege a vida da árvore. E a árvore cresce, e cresce, e cresce. Se você tirar a casca, ela fica exposta à doença, à desidratação, à morte. Então, sim, a igreja é morta, mas ela protege algo que está vivo. E quando você tem uma igreja sem casca, ela logo morre. Ela desaparece, adoece, e fica exposta a todos os tipos de doença, heresia e narcisismo. Nos meus escritos, eu espero recuperar um senso da realidade da congregação, o que ela realmente é. Ela é um dom do Espírito Santo. Por que nós estamos sempre idealizando o que o Espírito Santo não idealiza? Não existe nenhuma idealização da igreja na Bíblia, nenhuma. Agora nós já temos dois mil anos de história. Por que somos tão estúpidos?

Desde a Reforma, no entanto, temos cultivado a idéia de que a igreja pode ser reformada. Não aconteceu. Eu sou sempre a favor da reforma, mas achar que podemos ter uma igreja reformada é tolice. Acho que o pecado constante dos pastores, talvez especialmente dos pastores evangélicos, é a impaciência. Nós temos um objetivo. Nós temos uma missão. Nós vamos salvar o mundo. Nós vamos evangelizar todo mundo, e nós vamos fazer esse monte de coisas boas e encher nossas igrejas. Isso é maravilhoso. Todos os objetivos estão certos. Mas isso é um trabalho muito lento, essas coisas que envolvem a alma, isso de levar as pessoas a uma vida de obediência, amor e alegria diante de Deus. E nós nos impacientamos e começamos a usar todos os atalhos disponíveis. Nós falamos de benefícios. Manipulamos as pessoas. Nós as intimidamos. Nós usamos uma imagem incrivelmente impessoal, uma linguagem intimidadora, manipuladora.


Não é comum pensar na igreja como intimidadora.

Sempre que a culpa é usada como uma ferramenta para convencer alguém a fazer alguma coisa, seja uma coisa boa, ruim ou indiferente, isso é intimidar. E existe a linguagem manipuladora – convencer as pessoas a participarem de programas, envolvê-las, geralmente prometendo alguma coisa em troca.

Eu tenho um amigo que é expert nesse tipo de coisas. Ele sempre diz: “Você tem que identificar as necessidades das pessoas. Aí você desenvolve um programa para ir ao encontro dessas necessidades”. É muito fácil manipular as pessoas. Nós estamos tão acostumados a sermos manipulados pela indústria da imagem, da publicidade, pelos políticos, que dificilmente temos consciência de que estamos sendo manipulados.

Essa impaciência, que nos faz abandonar os métodos de Jesus para cumprir a obra de Jesus, é o que destrói a espiritualidade, porque estamos usando uma maneira não bíblica, que não é de Jesus, para fazer o que Jesus fez. É por isso que espiritualidade está essa bagunça que é hoje. Mas muitos pastores vêem as pessoas sofrendo com casamentos ruins, com drogas, vícios, ganância. Então tentam, corretamente, ajudá-los agora, usando qualquer método que funcione. Sim, só que às vezes o tiro sai pela culatra quando você é impaciente. De que maneira nós vamos ao encontro da necessidade? Nós fazemos como Jesus faria, ou como o Wal-Mart faria?

A espiritualidade não é uma questão de fins, de benefícios, de coisas; é uma questão de meios. É como você faz isso. Como você efetivamente vive? Então, como ajudar todas essas pessoas? As necessidades são imensas. Bem, você faz como Jesus faria. Você faz uma coisa de cada vez. Não dá para fazer a obra do evangelho, do reino, de uma maneira impessoal. Nós vivemos na Trindade. Tudo o que fazemos precisa estar no contexto da Trindade, o que significa que precisa ser feito pessoalmente, relacionalmente. No momento em que você começa a fazer as coisas impessoalmente, funcionalmente, para as massas, você nega o evangelho. Sim, nós fazemos isso o tempo todo.

Jesus é a Verdade e a Vida, mas primeiro ele é o Caminho. Não podemos fazer a obra de Jesus seguindo o caminho do Diabo. Eu sou experiente nessas coisas porque existem muitos pastores sendo castrados por essas metodologias, que são impessoais. Não existe relacionamento nelas. Então eles se guiam pelo desempenho, e se tornam bem sucedidos. Isso é muito fácil na nossa cultura, principalmente se você for alto e tiver um sorriso bonito. E eles perdem suas almas. Depois de 20 anos, não sobra nada. Ou eles desmontam. Eles tentam fazer esse monte de coisas, e não funciona, e eles desistem, ou começam a fazer outra coisa. Provavelmente 20 por cento dos casos extra-conjugais envolvendo pastores não são provocados pela luxúria, mas sim pelo tédio, por não ter esse tipo romântico de vida que eles achavam que teriam.


E se nós abordarmos a questão não em termos de necessidade, mas de relevância? Muitos cristãos esperam falar à geração X ou Y, ou aos pós-modernos, ou algum sub-grupo, como os cowboys ou os motoqueiros, pessoas para quem a igreja típica parece irrelevante.

Quando você começa a moldar o evangelho à cultura, seja uma cultura jovem, uma cultura de uma geração específica, ou qualquer tipo de cultura, você tirou a essência do evangelho. O evangelho de Jesus Cristo não é o reino deste mundo. É um reino diferente.

O meu filho Eric começou uma igreja nova há seis anos. Os presbiterianos têm uma espécie de acampamento para treinar pastores de igrejas novas, onde você aprende o que você deve fazer. Então o Eric foi. Um dos professores do treinamento falou que ele não deveria usar talar: “Você vai lá e encontra as pessoas dessa geração onde eles estão”.

Então Eric, sendo um bom aluno e querendo agradar seus colegas, não usou talar. A sua igreja começou a se reunir no auditório de um colégio. No começo ele usava terno todos os domingos. Mas quando veio o primeiro domingo de Advento, com Santa Ceia, ele me disse: “Pai, eu simplesmente não agüentei. Então eu pus um talar”.

Os vizinhos dele, Joel e sua esposa, foram à igreja. Joel era o estereótipo da pessoa para quem o modelo de desenvolvimento de igrejas novas era feito – suburbano, gerente, nunca foi à igreja, totalmente secular. Eric imaginou que Joel estava vindo porque eles eram vizinhos, ou porque ele o achava simpático. Depois daquele culto de Advento, ele perguntou o que o Joel achou do fato dele usar um talar.

Ele respondeu: “Me fez pensar. A minha esposa e eu falamos sobre isso. Acho que o que nós estamos procurando é um espaço sagrado. Nós dois achamos que encontramos”.

Eu acho que relevância é uma besteira. Eu não acho que as pessoas se importem muito com que tipo de música você toca, ou qual é a ordem de culto. Elas querem um lugar onde Deus seja levado a sério, onde elas sejam levadas a sério, onde não exista manipulação de suas emoções ou de suas necessidades consumistas.

Por que nós viramos vítimas dessa mentalidade de propaganda, de publicidade? Acho que ela está destruindo a igreja.


Mas outra pessoa pode entrar na igreja de Eric, ver ele usando um talar, e sair, achando que o ambiente era religioso demais, muito igrejeiro.

Então por que elas foram, se não era para ser religioso? Por que foram a uma igreja?


É claro que existe um outro lado da questão. Se você vai a uma igreja em que todo mundo está interpretando um papel de religioso, isso vai afastar as pessoas. Mas esse tipo de mentalidade performática, de pessoas interpretando papéis, também pode ser vista na igreja cowboy ou qualquer coisa assim – ali também, todo mundo está interpretando um papel. Mas nós estamos envolvidos com uma coisa que carrega uma grande dose de mistério. Vamos tirar todo o mistério, para ficar no controle? Será que a reverência não está na essência do culto a Deus? E se nós apresentamos uma forma de fé absolutamente sem mistério, sem reverência, como é que as pessoas vão saber que existe algo além de suas próprias emoções, suas próprias necessidades? E existe uma coisa acontecendo que é muito maior que minhas necessidades. Mas como é que eu vou saber disso, se o culto e o programa são completamente centrados nas minhas necessidades?


Algumas pessoas argumentariam que é importante ter um culto em que as pessoas se sintam à vontade para ouvir o evangelho.

Eu acho que elas estão erradas. Pegue essa história que eu contei sobre a família sentada na nossa frente no domingo. Ninguém estava confortável. A igreja toda estava sofrendo. E, mesmo assim, eles podem ter experimentado mais evangelho em ir até a mãe a abraçá-la, porque ela estava morrendo de vergonha.


Como podemos saber quando passamos do ponto em que adaptamos o ministério à cultura, para o ponto em que sacrificamos o evangelho?

Acho que um teste é este: Eu estou trabalhando a partir da história de Jesus, dos métodos de Jesus, da maneira de Jesus? Eu estou sacrificando os relacionamentos, a atenção pessoal, o relacionamento pessoal por um atalho? É só um programa para que as coisas sejam feitas? Não dá para fazer a obra de Jesus de uma maneira que não seja a de Jesus, e ficar por isso mesmo. Embora possa ser um grande “sucesso”. Uma coisa que eu considero uma característica minha é que eu fico no nível local. Eu estou enraizado numa vida pastoral, que é uma vida normal. Então, enquanto todo esse brilho e imagem de espiritualidade está por aí, eu me sinto bastante indiferente a tudo isso, para dizer a verdade. E eu tenho minhas suspeitas, porque parece ser um movimento sem raízes, não enraizado nas condições locais, que são as únicas condições em que você pode viver uma vida cristã.

Copyright © 2005 Christianity Today. Março de 2005, Vol. 49, Nº 3, Página 42

2 comentários:

  1. Rev. Ézio, parabéns pelo Blog. Estou sendo muito edificado pelos seus textos e os demais postados por você.
    Esta entrevista com o Eugene Peterson é pra fazer pensar.
    Seria possivel você escrever algo sobre Espiritualidade do Pastor? Um forte abraço,
    Carlos Silva

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  2. Fantástico o texto do Peterson!!
    Parabéns pelo post!
    Alex

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